Carta Aberta - David Williams

Carta Aberta aos Estudantes de Ashtanga Yoga
David Williams
Tradução: Fábio Furtado


Toda vez que eu viajo para diferentes partes do mundo ensinando Yoga, sempre me vêm à mente certos conceitos fundamentais sobre como ensinar e praticar Ashtanga Yoga, baseados em estudo e observação pessoais e nos meus 32 anos de prática ininterrupta. Penso serem importantes o suficiente para querer compartilhá-los com todos.

Primeiro, o mais importante de tudo – e espero que você possa aprender isso na sua prática: “Se dói, você está fazendo errado”. Ao longo dos anos, tenho visto gente demais se machucando e machucando outros. A prática de Yoga pode ser (e deveria ser) prazerosa do início ao fim. O que importa de fato é mulabandha e uma respiração profunda e completa. Com isso e por meio da prática diária, a obtenção de mais flexibilidade é inevitável.

Aprendi a partir da minha própria prática e observação que forçar as limitações que você tem em determinado momento para conseguir entrar em uma postura pode fazer com que você se machuque, e a conseqüência, no mínimo, será a necessidade de parar para que a lesão se recupere e então retomar a prática. Tal seqüência de eventos não é apenas desagradável, mas contrária à minha convicção de que, por meio de uma prática lenta, estável e diária, pode-se conquistar uma flexibilidade ainda maior – resultado da ação de nosso próprio calor interno, que nos faz relaxar nas posturas, em vez de forçar-nos nelas. Percebi que esse método mais lento, além de ser mais saudável e permitir o desenvolvimento de uma flexibilidade maior, faz com que ela seja de natureza mais duradoura do que a flexibilidade obtida quando se força uma postura. Infelizmente, como muitos acabam descobrindo, forçar nossas limitações pode trazer como resultado atividades reduzidas ou limitadas durante a recuperação. Esse ciclo pode produzir associações desagradáveis com a prática, em vez das experiências agradáveis que eu procuro apresentar e que me parecem ser necessárias para quem quer uma prática para toda a vida.

Penso ser importante mostrar às pessoas como elas podem fazer das séries do Ashtanga Yoga não só uma prática para toda a vida como também uma experiência absolutamente prazerosa. Imagino que, quando você viu a prática pela primeira vez, deve ter dito para você mesmo: “Se eu conseguir fazer isso, vai ser o máximo!”. Pois aí está: você já observou bastante a prática e quer continuar com ela. A chave então é se tornar apto a praticar Yoga pelo resto da sua vida. Depois de mais de 30 anos observando milhares de pessoas praticando Yoga, percebi que os que perduram são aqueles que sabem como tornar a prática algo de que possam desfrutar. Eles pensam na sua prática diária de tal maneira que nada pode impedi-los de achar um tempo para fazê-la. Ela se torna uma das partes mais prazerosas do seu dia. Os outros, consciente, subconsciente ou inconscientemente, desistem de praticar. E o meu objetivo, toda vez que encontro e dou aulas a novos alunos, é fazer tudo o que estiver ao meu alcance para inspirá-los a construir e estabelecer sua prática de Yoga não apenas durante os poucos dias em que estamos juntos, mas para o resto de suas vidas.

Em segundo lugar, espero que você possa entender que o principal objetivo do Yoga não é aumentar a flexibilidade ou a força. Uma maior flexibilidade e força são simplesmente resultados e benefícios naturais da prática diária. E, embora flexibilidade e força sejam benefícios importantes e visíveis do Yoga, acredito que a principal finalidade da prática do Yoga é a auto-realização e a capacidade de manter-se a si mesmo em equilíbrio e saudável todos os dias. A saúde é o seu maior bem. O DNA do corpo sabe o que é bom e saudável para o organismo; tudo o que ele precisa é de energia. A prática energizante e rejuvenescedora do Yoga pode ser a fonte.

Por último, vez ou outra me perguntam se alguém é “bom no Yoga”. Eu prontamente respondo que o melhor Yogin não é o mais flexível, mas o que está mais focado naquilo que ele ou ela estão fazendo e o que mais intensamente consegue realizar mulabandha e uma respiração profunda. É com certa tristeza que vejo pessoas “competindo na prática de Yoga” e também os que acabam desencorajados quando percebem tal competição e pensam que jamais serão capazes de fazer a sua prática com a flexibilidade e a destreza dos que estão mais avançados nas séries. O maior Yogin é o que consegue aproveitar a sua prática de Yoga ao máximo, e não aquele que é capaz de dar um nó cada vez mais complicado em si mesmo. Estou convicto de que, na prática dessa meditação em movimento que é o Ashtanga Yoga, o que realmente importa é o que está invisível ao observador, ou seja, aquilo que se passa dentro do praticante.

Eu acredito no Yoga. Acredito que qualquer um que queira pode praticar o Ashtanga, mesmo que com modificações que ajustem a prática à sua pessoa, de maneira que seja de fato prazerosa. Faz anos que costumo repetir: “Se alguém me diz: ‘Você tem 15 minutos, uma hora, etc., para fazer alguma coisa boa para você mesmo, então vá pescar, andar de bicicleta ou qualquer coisa assim’, eu começo imediatamente a fazer as Saudações ao Sol do Ashtanga Yoga e a Primeira Série”. Se alguém conseguir me mostrar algo melhor, estou pronto a aprender. Em meus 30 anos de busca, estudei cinco ou seis sistemas de prática do Yoga. E, para mim, não conheço nenhum programa de aptidão física, mental e emocional que seja melhor que o sistema do Ashtanga Yoga. Espero que você possa sentir o mesmo.

Seu no Yoga,
David Williams pratica Yoga desde 1971 e Ashtanga Vinyasa Yoga desde 1973, quando se tornou o primeiro não-indiano a aprender o sistema completo de asana e pranayama diretamente de Sri K. Pattabhi Jois em Mysore, Índia.

Respiração Ujjayi

Como tornar mais livre a Respiração Ujjayi
Artigo traduzido do Yoga Journal.
Tradução: Fábio Furtado



Meu professor disse que minha respiração Ujjayi é muito tensa. Tentei torná-la mais relaxada, mas não sei se estou fazendo direito.
— Heidi Palmqvist, Sófia, Bulgária

Tim Miller responde: Quando feita da maneira correta, a respiração Ujjayi (cuja tradução é “vitoriosa”) deve ser ao mesmo tempo energizadora e relaxante. Nos Yoga Sutras, Patañjali sugere que a respiração seja dirga (longa) e suksma (suave, macia). O som da Ujjayi é criado ao se contrair gentilmente a abertura da garganta, a fim de se produzir uma certa resistência à passagem do ar. No momento em que o ar é gentilmente puxado para dentro na inspiração e gentilmente empurrado para fora na expiração contra tal resistência, surge um som bem modulado e calmante – algo como o barulho das ondas do mar indo e vindo na beira da praia.

O cerne do seu problema pode ser algo tão simples quanto o esforço que você exerce para fazer Ujjayi. É importante lembrar que a chave para a respiração Ujjayi é relaxamento; a ação necessária para se fazer a Ujjayi é algo que naturalmente alonga a respiração. Um pequeno esforço é requerido para produzir um som agradável, mas esforço demais produz uma respiração sôfrega e um som irritante (um som que “raspa”). Geralmente, é a inspiração que representa um desafio maior. Por isso, comece praticando com a expiração, em que há um processo natural de deixar fluir.

Para treinar a inspiração, procure produzir um som suave e agradável, que seja sem pressa e sem esforço. Minha sugestão é trabalhar a sua respiração Ujjayi em uma posição sentada de pernas cruzadas que seja bem relaxada. Imagine que você está sorvendo o ar através de um canudo. Se a sucção é muito forte, o canudo colapsa e uma enorme força é necessária para sugar qualquer coisa através dele. Uma vez que a respiração Ujjayi tenha sido dominada em uma posição sentada, o desafio passa a ser manter a mesma qualidade de respiração em sua prática de asanas.

Na sua prática, procure manter a extensão e a maciez da respiração tanto quanto possível. Quando você tiver encontrado uma base para a sua respiração Ujjayi em uma postura que não exija tanto esforço (como Adho Mukha Svanasana, por exemplo), o objetivo passa a ser manter essa qualidade de respiração ao longo de toda a prática. Alguns asanas requerem bastante esforço, o que pode fazer com que você comece a tensionar a respiração. Se você sentir que está tensionando a sua respiração, pode ser que você esteja exigindo demais de você na sua prática. Use esse feedback como um termômetro para a prática – toda vez que você começar a tensionar demais, pode ser a hora de sair da postura e relaxar.

Tim Miller estuda Ashtanga Yoga há mais de vinte anos e foi o primeiro norte-americano certificado a ensinar por Pattabhi Jois, do Ashtanga Yoga Research Institute em Mysore, Índia. Tim possui um vasto conhecimento deste sistema ancestral, empregado por ele de maneira dinâmica e cuidadosa.

Yogasanas Sobre os Pés

Traduzido de: The Complete Book of Vinyasa Yoga, de Srivatsa Ramaswami
Tradução: Fábio Furtado


A primeira seqüência de asanas do método de se praticar yogasanas é a seqüência em pé, conhecida como postura da montanha. A postura da montanha, ou tadasana em sânscrito, presta-se a uma grande variedade de seqüências de vinyasas, extremamente úteis para exercitar todo o corpo. A progressão de vinyasas parte dos dedos aos nós dos dedos, pulsos, cotovelos e ombros, então ao pescoço, tórax, coluna torácica e lombar. O krama (ordem das posturas) envolve então, seqüencialmente, as articulações dos quadris e a pelve, os joelhos, tornozelos e o dorso dos pés. Assim, o corpo por completo é trabalhado. E tadasana é o eixo dessa seqüência, a qual contém diversas posturas importantes, como a flexão para a frente (uttanasana) e a postura de cócoras (utkatasana).

O Equilíbrio

Um dos parâmetros que definem um asana é estabilidade, ou bom equilíbrio. Esteja você sobre os seus pés ou apoiado sobre a cabeça, estabilidade é um componente vital para a prática de asanas. Tadasana e os seus diversos vinyasas ajudam a aumentar consideravelmente o senso de equilíbrio. Quando se está agitado, não é possível permanecer estável e tende-se a perder o equilíbrio. Tadasana, se praticado regularmente, trará um bom senso de equilíbrio e produzirá um estado mental mais calmo, que no nível físico se manifesta como estabilidade.

Fique em pé, ereto, com os pés juntos, os ossos dos tornozelos se tocando (você pode também manter as suas coxas se tocando). Os músculos das extremidades inferiores – coxas, panturrilhas e glúteos – devem permanecer relaxados. Seus joelhos em particular devem ficar relaxados, mas não flexionados. Não suba a patela nem force os joelhos para trás, para que a musculatura de trás da coxas não se tencione. Traga a sua pelve ligeiramente à frente, de modo que as pernas fiquem retas sem estarem rígidas. Você deve erguer um pouco o peito, e trazer as escápulas uma em direção à outra, de maneira que a parte superior do seu corpo também esteja reta. Mantenha a sua cabeça estável.

Essa posição é conhecida como tadasana-samasthiti. Samasthiti significa estado de equilíbrio. Sama, em sânscrito é um cognato para a palavra “same” [“mesmo”, “igual”], do inglês. Quando existe a mesma quantidade de peso do corpo distribuída sobre os pés, isso é chamado samasthiti. Em tal posição, o peso do corpo é transmitido pelas pernas sem que nenhum dos músculos esteja contraído. É o ponto de partida para toda a seqüência de vinyasas em tadasana.

Pressione agora o seu queixo sobre a junção esternoclavicular ou, se possível, sobre o próprio esterno, com o cuidado de manter as costas eretas. Este é o chamado jalandhara bandha.

Observe com atenção o seu equilíbrio. O corpo tem uma certa oscilação, cuja amplitude tende a diminuir gradualmente conforme você observa a sua “ação de manter o equilíbrio”. Permaneça nessa posição pelo menos por um minuto, observando o equilíbrio.

Antes de irmos adiante, por favor me permita uma rápida digressão para examinar algumas posições menos conhecidas de samasthiti que requerem um senso de equilíbrio ainda melhor. Tadasana, ou postura da montanha – alguns a chamam de postura da árvore (vrikshasana) – é outra forma de samasthiti. Para entrar nela, levante os braços e entrelace os dedos ao mesmo tempo que ergue os calcanhares (mantendo os tornozelos unidos). Permaneça nesta posição por 5 segundos, com a respiração suspensa, ou durante algumas respirações. Observe atentamente o seu equilíbrio. Com o tempo, procure aumentar o tempo de permanência nesse estado.

(...)

As Checagens

Agora, que já discutimos o equilíbrio, vamos examinar alguns parâmetros, a começar pela primeira forma de samasthiti que vimos. Conforme exposto na introdução, um dos componentes mais importantes na prática de yogasanas com vinyasa krama é o emprego da respiração para conectar ou atrelar mente e corpo enquanto os movimentos são feitos. Uma das definições populares do yoga é a integração da mente e do corpo. A respiração é o meio pelo qual isso é alcançado, de acordo com Patañjali (Yoga Sutras, capítulo II, sutra 46) e com os conhecedores de vinyasa krama, como o meu revernciado guru, Sri T. Krishnamacharya. Daí que o próximo passo seja começar com o processo de integração da sua mente com a respiração, antes de iniciar os movimentos propriamente ditos. Para tanto, fique ereto mas relaxado em samasthiti, mantendo a sua cabeça baixa, e dirija a atenção para o centro da sua cavidade torácica (dentro do peito). Em seguida, tratemos do segundo aspecto da prática de vinyasa, que é a atenção sobre a respiração. Mantendo os olhos fechados, volte a atenção para dentro do peito. Localize o ponto onde você sente que a sua respiração está centrada: o ponto de onde a inspiração parece partir e para o qual a expiração converge. Não é o ar que você quer observar, mas o lento movimento para dentro e para fora do prana. Esta posição [e mais especificamente o ponto em si] é conhecida também como pranasthana, ou “o lugar da respiração” [ou ainda “lugar do prana”]. Fique atento à respiração neste ponto pelo menos por um minuto e desta forma conecte a sua mente à respiração.

Continue atento à respiração por mais 3 ou 6 longas e suaves inspirações e expirações, agora com uma sensação de fricção na garganta. Meu professor costumava dizer que o suave som aspirado [silvo] que se produz deveria ser parecido com o de uma cobra. É a chamada respiração ujjayi. A suave inspiração e expiração através da glote parcialmente fechada é o que produz o som sibilante característico da respiração ujjayi.

O próximo objetivo é conectar a sua respiração aos seus movimentos com o total envolvimento da sua mente. Investiguemos a seguir este importante aspecto do vinyasa krama yoga.

O nosso padrão normal de respiração é de aproximadamente 15 respirações por minuto. Em vinyasa krama, reduz-se consideravelmente este padrão. Iniciantes podem respirar em um ciclo de aproximadamente 6 respirações por minuto enquanto praticam. Com uma prática diligente, é possível a “experts” reduzir o seu ciclo respiratório para cerca de 2 respirações por minuto durante todo o tempo de sua pratica de asanas, com pausas para descanso.

Tendo-se conectado com o centro da respiração (pranasthana), faça agora a respiração ujjayi algumas vezes, mantendo a cabeça baixa. Lembre-se de respirar com um som sibilante e uma sensação de fricção na garganta, produzidos a partir do fechamento parcial da glote. Tanto a inspiração quanto a expiração devem ser suaves e uniformes. De fato, alguns dos textos sobre o yoga, como as antiga Upanishads do Yoga, especificam que a inspiração deve ser como beber água através da haste de um líro-azul-de-água (nilotpala nala). Ou seja, a inspiração deve acontecer dentro de um padrão uniforme e de modo contínuo, como quando você sorve água por um canudo. Da mesma maneira, a expiração é comparada ao fluxo de óleo (taila dharaavat), o que significa que a expiração deve ser suave e uniforme como quando você deita um fio de óleo de uma concha.

Você agora está pronto para iniciar o vinyasa krama em tadasana. A primeira série de movimentos (vinyasas) envolverá basicamente os braços. Por favor, tenha em mente que a posição padrão da cabeça é com o queixo para baixo, exceto quando a cabeça tiver que virar para algum dos lados, como se requer na maioria dos movimentos de torção, ou em “back-bendings” e situações similares. A posição do queixo para baixo (ou fecho do queixo, preferencialmente) auxilia a manter um bom equilíbrio e um bom controle da respiração ujjayi, além de deixar a coluna alongada.

Parâmetros do Vinyasa Yoga

Traduzido de: The Complete Book of Vinyasa Yoga, de Srivatsa Ramaswami
Tradução: Fábio Furtado


A palavra sânscrita vinyasa é composta por um prefixo, vi, que significa “variação”, e por um sufixo, nyasa, que significa “dentro de parâmetros prescritos”. Os parâmetros prescritos, no yoga clássico, no que se refere à prática de yogasanas, de acordo com os Yoga Sutras de Patañjali, são:

Estabilidade / firmeza / permanência (sthira). Para que uma postura seja considerada como um yogasana, ela deve proporcionar ao praticante a habilidade de permanecer estável, seja sobre os pés (tadasana) ou sobre a cabeça (shirshasana).

Conforto (sukha). O uso da respiração e a cuidadosa atenção da mente sobre ela, que são traços distintivos do yoga, garantem considerável prazer e relaxamento ao praticante.

Respiração suave e longa (prayatna shaitilya). É o método prescrito por Patañjali para facilitar a prática do yoga. Prayatna (esforço) aqui se refere a jivana prayatna, ou esforço de vida, o que, como é fácil inferir, é respirar. Tal condição determina que, ao se praticar os asanas, a respiração deve ser suave e longa. Assim, ao se fazer yoga da maneira correta, não se deve ofegar pesadamente. Em contraste com exercícios aeróbicos (que em si têm seus benefícios), nem o ciclo respiratório, nem o cardíaco devem aumentar enquanto se pratica yoga. O ciclo respiratório normal é de aproximadamente 15 a 20 respirações por minuto. Uma vez que os movimentos no vinyasa yoga são lentos, é preciso, ao fazê-los, diminuir da mesma forma o ciclo de respirações. Um bom parâmetro a ser seguido é não ultrapassar 6 respirações por minuto. Pode-se inspirar durante 5 segundos em um movimento expansivo (como por exemplo ao esticar os braços, ou as pernas, ou ao flexionar as costas para trás) e expirar suavemente ao se flexionar para frente, em torsões, ao se flexionar os joelhos ou em quaisquer contrações similares do corpo.

A inspiração suave acompanhada de um movimento expansivo é denominada brahmana kriya, ou ação (respiratória) expansiva; a expiração durante a contração do corpo é langhana kriya, ou ação (respiratória) contrátil ou redutiva. Quando se inspira ao se fazer um movimento expansivo e, correspondentemente, se expira durante uma contração, isso é conhecido como anuloma, ou movimento/respiração “com o grão” [aqui talvez seja mais adequado “veio”, “de acordo com o veio”]. Exercícios anuloma produzem um efeito de harmonia entre as estruturas respiratórias do organismo e o corpo como um todo.

Embora anuloma seja a regra geral, há situações em que se pode ou se deve expirar durante um movimento expansivo (o contrário, entretanto, nunca ocorre, já que não é possível fazer movimentos de contração ao se inspirar). Pode ser recomendado quando o praticante é tenso, obeso, idoso ou com muito pouco alongamento. Tome-se como exemplo a postura da cobra (bhujangasana). A partir da posição de bruços, adotar a postura da cobra é um movimento expansivo e deveria ser feito durante a inspiração. Mas algumas pessoas especialmente tensas sentem extremo desconforto, já que tendem a enrigecer a musculatura e virtualmente impossibilitar a flexão da coluna. Uma situação semelhante pode acontecer com pessoas obesas, uma vez que a barriga tende a adicionar pressão durante a inspiração. Dessa forma, pessoas em tais condições têm a possibilidade de expirar ao fazerem movimentos expansivos. Cabe ao estudante e/ou ao professor determinar que tipo de respiração é mais apropriada para um vinyasa em particular. Outra regra geral é: “quando estiver em dúvida, faça o movimento durante uma expiração”.

O Padrão Respiratório na Prática de Vinyasa

Durante a prática de vinyasa yoga, deve-se fazer ujjayi, que é a “respiração da garganta”, uma vez que o ujjayi facilita o necessário controle “sem suporte/ajuda” da respiração. Se, ao fazer diversos vinyasas em uma seqüência, a pessoa sentir que se excedeu ou ficar sem ar/com dificuldade para respirar, deve descansar por um ou dois minutos até recuperar a respiração. Quem pratica tais vinyasas com freqüência percebe que o seu ciclo respiratório diminui depois de um certo tempo, tanto durante a prática quanto habitualmente; a mente, da mesma forma, se torna mais calma e contente. Há yogis que conseguem praticar com um ciclo consistente de aproximadamente 4 respirações por minuto, sem se sentirem nem muito pesados nem, por outro lado, apressados. Tais pessoas demonstram extremo relaxamento ao permanecer em uma postura complexa, como por exemplo a parada sobre os ombros, sobre a cabeça, alongamentos posteriores ou mahamudra.

Focar a Mente na Respiração (Ananta Samapatti)

A palavra sânscritas ana significa “respiração” (ana é o equivalente de swasa, uma palavra do sânscrito bastante conhecida que também significa respiração/respirar). Samapatti é total concentração mental. Deve-se focar mentalmente na respiração durante a prática de vinyasa. Cada vez que a mente divagar, deve-se gentilmente trazê-la de volta à concentração na respiração. No mais das vezes, a maioria das pessoas acham fácil manter atenção mental na respiração e sentem satisfação no processo.

Vinyasa krama na prática de asanas do yoga foi o principal pilar dos ensinamentos sobre asana de meu guru. Por 30 anos eu estudei esse método com ele, observei-o ensinando outros alunos e participei de suas conferências-demonstrações. Nem uma única vez eu o vi ensinar a prática de asanas sem vinyasas e/ou respiração coordenada acompanhando os movimentos. Esta é a chave para o correto ensinamento de vinyasa krama. É preciso manter a prática de uma respiração lenta e suave, e também conhecer a variedade completa de asanas. Somente pelo conhecimento completo e pela seleção cuidadosa dentre os diversos asanas que professores e terapêutas podem adequadamente traçar programas de prática para estudantes com múltiplas necessidades.

(...)

Meu guru acreditava que o método correto de vnyasa é essencial para se receber os benefícios completos da prática do yoga. O trecho a seguir, que traduzi do Yoga Makaranda [livro escrito por Krishanamacharya sobre a prática do yoga, a pedido do Maharaj de Mysore], captura perfeitamente esse sentimento.

“Anúncio Importante

Desde tempos imemoriais as sílabas védicas (...) são entoadas com as notas corretas (alta, baixa e equalizada). Da mesma forma, sruti (tom) e laya (ritmo) regem a música clássica indiana. A poesia sânscrita clássica segue regras estritas de chandas (metro), yati (cesura) e prasa (assemblage). Além disso, no ato devocional com mantras, nyasas (usualmente a circunscrição de diferentes partes do corpo às diversas deidades, com mantras e gestual) – tais como Kala nyasa, Jiva nyasa, Matruka nyasa, Tatwa nyasa – são partes integrais. É da mesma maneira que yogasanas (posturas do yoga), pranayamas (exercícios yóguicos de respiração) e mudras (selos, fechos, gestos) têm sido praticados com vinyasas desde tempos imemoriais.

No entanto, nos dias atuais, em diversos lugares, muitas grandes almas que ensinam yoga o fazem sem os vinyasas. Eles tão somente estendem ou contraem os membros e proclamam que estão praticando yoga.

(...)

Que qualquer atividade feita sem os procedimentos corretos (niyama) não produzirá os resultados pretendidos é bem sabido de todos. Sendo este o caso, pode-se muito bem ressaltar que seria da mesma forma com qualquer prática elevada, como yoga, canto védico ou meditação com mantras. Por causa de associações errôneas, pessoas meramente interessadas em benefícios materiais praticam o perene yoga e outras disciplinas, mas não derivam quaisquer benefícios tangíveis.

Eu diria que existem duas razões principais para isso:

Elas não seguem as disciplinas de vinyasas e outras mencionadas nos textos.
Os seus professores não trazem as nuances do sistema quando ensinam. (...)

Assim como a música sem o tom (sruti) e o ritmo (laya) corretos não trará alegria, a prática dos yogasanas sem a obsrevância dos vinyasas não conferirá saúde. Neste caso, o que dizer de vida longa, força e outros benefícios?”

Conceitos

Tradução: Fábio Furtado

Sobre a prática de asanas (posturas), o terceiro membro ou passo do Ashtanga Yoga, segundo os Yoga Sutras:

Sutra II, 46: sthira-sukham aasanam.
Sthira: permanência, estabilidade
Sukham: conforto

Tradução: Um asana (uma postura) [como fazendo parte do yoga] é tal que seja estável (que tenha permanência) e confortável (relaxado).

Sutra II, 47: prayatna shaitilya ananta samaapattibhyaam.

Explicação, segundo Srivatsa Ramaswamy, em Yoga for the Three Stages of Life, cap. 7:

Patañjali indica os meios para se alcançar a pefeição nas posturas (aasanas) quando ele diz (II,47) prayatna shaitilya ananta samaapattibhyaam. A palavra prayatna normalmente tem o sentido de “esforço”. Ao passo que isso é geralmente correto, a palavra em questão deve ser tomada como termo técnico e o seu sentido apropriado investigado. Muitos autores e comentadores assumiram essa palavra como significando “esforço em geral”, o que se traduz no pedido que se costuma fazer aos estudantes para não forçar a si mesmos em uma determinada postura, mas, em vez disso, relaxar nela. Nyaaya, uma filosofia irmã do yoga, divide prayatna em três grupos. São estes pravrtti, nivrtti e jiivana prayatna. Pravrtti e nivrtti são citta vrttis (discutidos anteriormente) e suas ações físicas correspondentes, tais como mover-se para frente para encontrar e cumprimentar um amigo ou assumir uma ação evasiva para não ser atingido por um carro em alta velocidade. Jiivana prayatna, entretanto, se refere aos esforços feitos por um indivíduo para manter a vida e, mais especificamente, a respiração. Este é o saamaanya vrtti a que faz referência o capítulo 4. Portanto a palavra prayatna deve ser entendida com o sentido de “o esforço de respirar”. E este deve se tornar suave (shithila, donde vem shaithilya, “relaxar”). Assim, durante a prática de aasanas, a respiração deve ser suave, e no sistema do meu professor [Krishnamacharya] é portanto mandatório interromper a prática e descansar quando a respiração não está suave. Uma respiração curta está associada a uma mente fragmentada (shvaasa prashvaasah, viksepa saha bhuvah), de modo que uma respiração sincronizada, suave e longa (tanto a inspiração quanto a expiração) se torna um fator sine qua non para a prática de aasana em vinyaasakrama [sistema de vinyaasa].

O sutra de Patañjali tembém menciona samaapatti, ou “fixar a mente”. É comum que a mente das pessoas se encontre vagando enquanto elas praticam asanas, especialmente quando elas se acostumam a eles. O esforço se torna mecânico, um hábito, como dirigir um carro, quando não se está completamente concentrado. Portanto, onde a mente deve se concentrar? A resposta está tembém no sutra. Resumidamente, deve-se concentrar em ananta (ananta samaapattibhyaam), cujo termo literalmente significa “não dobrado” ou “infinitude” (an + anta = ananta); certas escolas sugerem que deve-se concentrar na infinitude enquanto se praticam os asanas. Para um iniciante, até mesmo tentar algo assim é difícil – quase impossível. Ananta, no entanto, é o nome de Naagaraja ou Adishesa, de quem Patañjali foi um avataara. Deve-se então – é o que algumas tradições de yoga requerem – contemplar a figura de Naagaraja ou Patañjali, cujos ícones e ídolos podem ser obtidos em determinados templos e também em escolas de yoga que têm o vigraha (ícone) de Patañjali. O dhyaana sloka (oração de invocação) de Patañjali descreve sua forma (aakaara) e magnificência (prabhaava), e, na figura de Ananta, ele é o primeiro proponente e guru do Yoga.

“A palavra ananta também significa “respiração”, significado que é mais apropriado aqui. Ana é respiração (ana shvaase), como na palavra praana (pra + ana). Assim é correto dizer que se deve mentalmente seguir a respiração enquanto os movimentos nos aasanas são feitos. Uma atenção bem próxima à respiração é o ponto de conexão entre a mente e o corpo. Pode-se concluir a partir disso que ao se praticar aasanas, feitos com uma respiração intencional e fixidez da mente, atinge-se estabilidade [sthira, ver sutra anterior] e relaxamento [sukha, idem], o que é aasana siddhi (perfeição/realização/dom em asana). Dessa forma, o indivíduo não é mais afetado pelos pares de opostos, tais como febre e hipotermia e outras condições de oposição, sejam físicas ou mentais. O aasanaabhyaasii [praticante de asana] desenvolve por meio disso uma tolerância a dores derivadas de oposições (dvanda), como calor e frio, ridicularia e elogio, sucesso e fracasso; a sua resistência é bastante desenvolvida.

Há quatro fatores na respiração yogue. O primeiro é puuraka, ou inspiração. O segundo, sustentar o ar dentro dos pulmões após a inspiração, é chamado de antah-kumbhaka. O terceiro é recaka, ou expiração controlada. O quarto, sustentar o ar fora dos pulmões, é chamado baahya-kumbhaka. Todos os movimentos do yoga são feitos deliberadamente e com um tipo específico de respiração. Alguns movimentos devem sempre ser feitos enquanto se inspira, e há outros que devem ser feitos ao se expirar. Pode-se ainda permanecer em uma postura enquanto se suspende a respiração com o ar dentro ou fora dos pulmões, ou pode-se empreender um ciclo controlado de respiração yogue enquanto se está em uma postura. Mas há também certos movimentos que podem ser feitos tanto ao se inspirar quanto ao se expirar, dependendo da condição do praticante e dos resultados desejados. Movimentar-se durante a inspiração e enquanto se sustenta o ar dentro dos pulmões é brahmana kriyaa, e movimentar-se durante a expiração e enquanto se sustenta o ar fora dos pulmões é langhana kriyaa. No Ayurveda, ou ciência da medicina (ou da vida), brahmana kriyaa é um termo que está ligado à nutrição, e langhana kriyaa à abstenção de comida (jejum), mas tais palavras têm um sentido algo diferente em yogaabhyaasa. Os kriyaas em uma prática de yoga sattvica são o uso do ar natural para a limpeza dos naadiis e não o uso de tecidos ou outros suportes externos. Assim, o uso da respiração nos aasanas auxilia o praticante a relaxar e alcançar a postura desejada. A respiração ajuda ainda a localizar e trabalhar sobre músculos mais profundos e também sobre os órgãos internos do corpo, algo que de outra maneira poderia não ser possível. Além disso, sabe-se que, com uma respiração deliberada, impede-se que a mente vagueie a esmo, já que está empenhada em seguir a respiração. A prática do yoga se torna dessa forma muito mais completa. O Yogi Naathamuni, que se acredita ser o autor do Yoga Rahasya, chama cada um dos dezesseis capítulos do seu tratado um kalaa, palavra que significa “arte”. Como em música ou qualquer outra forma de arte, é preciso desenvolver sensibilidade e competência por meio de prática deliberada e intensa concentração.

Assim como remédios, além dos bons efeitos, os yogaasanas podem também trazer alguns efeitos colaterais menores, os quais são, essencialmente, físicos. Para contrabalançá-los, toda a postura praticada possui uma contrapostura ou uma seqüência de contramovimentos que auxiliam a manter os efeitos do aasana principal e contrapor quaisquer aspectos indesejados. Por exemplo, shirsaasana tem efeitos positivos em todo o sistema. Mas deve ser seguido por sarvaangaasana. Se sarvaangaasana for feito como a postura principal (digamos, por dez minutos ou algo próximo a isso), deve ser seguido por algum tipo de back-bending suave e ao mesmo tempo algum tipo de exercício que alongue o pescoço, como bhujangaasana ou shalabhaasana, seguidos ainda pela postura sentada padmaasana. De fato, algumas contraposturas, ou pratikriyaas, ajudam a reter os benefícios da postura principal. A combinação shirsaasana-sarvaangaasana é um bom exemplo. É preciso ver o efeito de se fazer aasanas e suas contraposturas diligentemente para perceber a diferença entre um regime organizado ou seqüência planejada de aasanas e vinyaasas e uma prática de aasanas aleatória. Além da ênfase na respiração consciente nos aasanas, conforme se progrida na prática, o uso de bandhas, que envolvem a contração de grupos musculares específicos, é recomendada para que se obtenha maiores benefícios. Entre os muitos bandhas, três são extremamente importantes. O muula bandha requer que se contraia para dentro [do corpo] o reto, o diafragma pélvico e o baixo abdômen, como se ele fosse tocar a coluna (para alcançar a perfeição). Isso é feito [com e] depois da expiração. Deve-se observar que, ao menos nos estágios iniciais, deve-se praticar brahmacarya (abstinência) para se chagar à maestria do muula bandha. O uddiiyaana bandha é a contração para dentro [do corpo] da região do umbigo, novamente como se fosse encostar na coluna, e a elevação do diafragma de tal modo que a região abdominal fique escafóide, ou abaulada. É evidente que pessoas obesas não conseguirão fazer uddiiyaana bandha satisfatoriamente, donde a necessidade do controle da dieta, ou tapas, na prática de aasana para conduzir o corpo à sua forma adequada. O jaalandhara bandha envolve alongar a parte posterior do pescoço e fazer pressão com o queixo sobre o esterno, cerca de três polegadas para baixo do pescoço. Isso efetivamente controla a passagem do ar durante a respiração e é um grande auxílio tanto para praanaayaama quanto para o controle da respiração na prática de aasana vinyaasas. Esses três bandhas (bandha traya) são importantes na prática de aasanas. Pode não ser possível para iniciantes praticá-los desde o começo em sua prática de yoga, mas terão de fazê-lo conforme progridam. Deve ser observado, entretanto, que o trabalho com os bandhas não deve ser empreendido sem a direção de um professor competente que os tenha ele próprio praticado e dominado.

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Deve-se observar que os yogaasanas devem ser praticados de acordo com sampradaaya (tradição) para que se alcancem os benefícios mencionados nos textos. O paddhati (sistema) de nosso aacaarya [Krishnamacharya], baseado nas shastras, é tal que a prática de aasanas deve ser feita com as restrições necessárias (yamaniyamas), ou prerequisitos. Toda prática deve ser feita com preparação, progressão e variação das posturas (vinyaasa), com a correspondente respiração sincronizada, consciente e modulada, e o todo entrecortado por contraposturas e contramovimentos epsecíficos (pratikriyaas), além do emprego de bandhas e mudraas nas fases apropriadas.